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Diagnóstico por Imagem

A contribuição da tomografia computadorizada, ultrassonografia ao modo-B, doppler colorido e contraste de microbolhas na avaliação de lesão focal hepática em cães – revisão de literatura e relato de caso

Créditos: Cibele Figueira Carvalho Créditos: Cibele Figueira Carvalho

The contribution of Computed Tomography, B-mode Ultrasound, Doppler and Contrast-Enhaced Ultrasound evaluation of hepatic focal lesions in dogs – review and a case report

La contribución de la tomografía computarizada, ultrasonografía modo B, Doppler color y contraste de microburbujas en la evaluación de lesión hepática focal en perros – revisión y reporte de caso

 

Clínica Veterinária, Ano XXX, n. 177, p. 38-52, 2025

DOI: 10.46958/rcv.2025.XXX.n.177.p.38-52

 

Resumo: As lesões focais hepáticas são comuns em cães, especialmente em animais idosos, e podem ser benignas ou malignas. Ferramentas de diagnóstico por imagem, como a ultrassonografia e a tomografia computadorizada são utilizadas para identificação e avaliação das características de tais lesões por oferecerem informações que podem estreitar as hipóteses diagnósticas, uma vez que o exame histopatológico considerado como padrão-ouro para o diagnóstico definitivo nem sempre é viável para determinados pacientes. O presente relato descreve um cão macho da raça golden retriever, de 13 anos de idade, com histórico de formações hepáticas detectadas à ultrassonografia, submetido à tomografia computadorizada abdominal e a outros recursos de imagem, para avaliação das características das lesões e adquirir informações diagnósticas adicionais no auxílio à diferenciação entre benignidade e malignidade.

Unitermos: pequenos animais, diagnóstico por imagem avançada, fígado

 

Abstract: Hepatic focal lesions are common findings in dogs, especially in older patients, and they can be benign or malignant. Imaging diagnostic modalities, such as ultrasonography and computed tomography, are commonly used to identify and assess the morphology of these lesions. They can add information to narrow the diagnostic possibilities, regarding that even the histopathological procedure considered the gold-standard for definitive diagnostic, is not always possible in certain patients. The present report describes a male dog, Golden Retriever, 13 years-old, with history of liver masses detected by B-mode ultrasonography. The patient was submitted to Triple-Phase Helical Abdominal Computed Tomography, as well as other imaging techniques to evaluate the liver lesions features and aid the differentiation between benign versus malign injury.

Keywords: small animals, advanced imaging diagnostic, liver

 

Resumen: Las lesiones hepáticas focales son comunes en perros, especialmente en animales de edad avanzada, y pueden ser benignas o malignas. La tomografía y el ultrasonido pueden contribuir para identificar y evaluar las características de dichas lesiones agregando informaciones que pueden acotar las hipótesis diagnósticas, ya que el examen histopatológico considerado el estándar de oro para obtener un diagnóstico definitivo, no siempre es viable para ciertos pacientes. El presente informe describe un perro Golden Retriever macho, de 13 años, con antecedentes de formaciones hepáticas detectadas mediante ecografía, y sometido a tomografía computarizada abdominal, así como otras herramientas, para evaluar las características de las lesiones y obtener información diagnóstica adicional para ayudar en la diferenciación entre benignidad y malignidad.

Palabras clave: animales pequeños, diagnóstico por imagen avanzado, hígado

 

Introdução

O fígado de cães é frequentemente avaliado por meio de exames de diagnóstico por imagem como recurso complementar aos exames físico e laboratoriais. O fígado é localizado no abdome cranial, cranialmente em contato com o diafragma, e caudalmente com estômago, pâncreas, duodeno e rim direito 1,2. Seu parênquima é dividido em seis lobos que podem ser diferenciados aos exames de imagem com maior ou menor acurácia na dependência da técnica utilizada, por meio de referências anatômicas, como a vesícula biliar, o rim direito, o estômago e os vasos hepáticos 1,2.

As lesões hepáticas podem ser inicialmente classificadas como difusas, focais e multifocais. Lesões focais são comuns em cães, especialmente em animais idosos 3. Contudo, neoformações malignas representam menos de 1,5% 3,4,5, onde mais da metade são carcinomas hepatocelulares e 22 a 40% são colangiocarcinomas, enquanto que nódulos metastáticos são mais frequentes que os tumores primários. As formações benignas incluem hiperplasia nodular, adenoma hepatocelular e adenoma de ducto biliar 3.

O câncer é uma doença comum em cães, e apesar de todas as raças poderem ser afetadas, inclusive os cães sem raça definida, sabe-se que algumas raças específicas como golden retriever, flat-coated retriever, bernese, labrador e setter apresentam predisposição a alguns tipos de neoplasias, demonstrando uma susceptibilidade genética 6. Já foi observado que o carcinoma hepatocelular foi diagnosticado preferencialmente em cães mais idosos, e as raças welsh corgis e beagles são as mais frequentemente afetadas por tal afecção 7.

Na avaliação dos exames de imagem, como a ultrassonografia (US) e a tomografia computadorizada (TC), as lesões focais hepáticas caninas podem ser descritas, de maneira generalista, quanto à sua morfologia, definição de contornos, margens e dimensões 4,8-10. Contudo, diferentes modalidades de imagem oferecem avaliações específicas referentes a tais lesões. Dessa forma, a TC também determina o grau de atenuação (como hipoatenuantes, isoatenuantes e hiperatenuantes em comparação ao parênquima hepático hígido), homogeneidade, e o comportamento do contraste iodado em diferentes fases (arterial, venosa e tardia) 3-5. Já a US oferece informações quanto à sua ecogenicidade, ecotextura, padrão de distribuição vascular pelo mapeamento ao Doppler colorido e o comportamento hemodinâmico do contraste por microbolhas nessas lesões, como recurso complementar 1,3,11-13. Tais modalidades procuram, cada qual com suas características, reunir informações específicas das formações e categorizá-las, na tentativa de adicionar informações morfológicas aos demais aspectos clínicos, priorizando algumas suspeitas, e assim estreitarem as possibilidades, quando o diagnóstico definitivo das formações pelo exame histopatológico não for viável 14. Desta forma, o emprego de tais recursos pode propiciar um prognóstico presuntivo e contribuir na conduta a ser adotada com o paciente.

Sabe-se que exames citológicos podem auxiliar e os histopatológicos são determinantes no diagnóstico definitivo de lesões focais hepáticas. Contudo, são procedimentos mais invasivos, que podem ter limitações quanto à sua realização, na dependência das condições do paciente, do número de lesões, do acesso para a obtenção da amostra e de outros fatores que podem dificultar a sua execução 15. Dessa forma, exames como a TC e a US são amplamente utilizados na rotina clínica de pequenos animais como modalidades complementares na avaliação hepática, e diversos estudos têm sido realizados para a otimização de tais procedimentos, visando a sua aplicação na oncologia de pequenos animais.

 

Ultrassonografia

Ultrassonografia modo-B

A ultrassonografia possui grande eficácia na detecção de lesões focais hepáticas, apesar do aspecto de diferentes formações apresentarem-se de maneira bastante variável 16,17. Formações periféricas são também facilmente observadas por meio da deformidade da sua cápsula. Lesões focais detectáveis são os cistos, as áreas hemorrágicas e de necrose, os hematomas, os abscessos, a hiperplasia nodular, os granulomas e as neoplasia primárias e metastáticas 16.

Os cistos são normalmente achados incidentais; são caracterizados como estruturas arredondadas, anecogênicas, de paredes finas e bem definidas, e eventualmente podem apresentar septações e debris internos 16,17. Os hematomas possuem frequentemente margens irregulares e suas características variam de acordo com a idade da formação, sendo hiperecogênicos na fase mais aguda e hipo ou anecogênicos quando o coágulo se organiza. Necrose e abscessos também possuem variação de seu aspecto de acordo com o tempo de formação, tendo o abscesso (raro) normalmente um centro anecogênico com debris ecogênicos internos ou hipoecogênico e uma margem irregular hiperecogênica 9,16-18.

A hiperplasia nodular é um achado frequente em cães idosos, e são lesões benignas que possuem dimensões normalmente menores do que 5cm que apresentam contornos regulares e aspecto normalmente hipoecogênico, mas também podem aparecer iso ou hiperecogênicos 9,16-18.

As neoplasias hepáticas primárias ocorrem de maneira menos frequente que as metastáticas. O aspecto ultrassonográfico é variável, devido aos diferentes padrões vasculares, graus de necrose, edema e hemorragia, componentes inflamatórios e áreas de mineralização, não sendo possível a diferenciação dos tipos tumorais com o emprego dessa metodologia. Contudo, algumas características foram descritas em certas neoformações hepáticas diagnosticadas histologicamente. Formações únicas ou multifocais hiperecogênicas ou mistas podem sugerir carcinoma hepatocelular. Lesões cavitárias e complexas (com septações internas ecogênicas) podem representar colangiocarcinoma e hemangiossarcoma 9. Formações hipoecogênicas com centro hiperecogênico (lesões em alvo) podem ser relacionadas a metástases 17. De qualquer forma, neoplasias hepáticas devem ser incluídas na lista de diferenciais em cães idosos com lesões hepáticas focais e multifocais 19.

Estudos baseados na avaliação ultrassonográfica de lesões hepáticas focais têm sido realizados para auxiliar na diferenciação de formações benignas e malignas. Em um deles, observou-se que as lesões malignas possuem relação positiva com maiores dimensões e presença de efusão peritoneal 20. Também foram determinados fatores de malignidade de lesões hepáticas com o emprego de dados clínicos e características ao exame ultrassonográfico modo-B, e foi observado que as lesões maiores do que 4,1cm e heterogêneas têm uma maior possibilidade de malignidade 21.

 

Ultrassonografia Doppler

A ultrassonografia Doppler pode ser complementar ao modo-B na avaliação das lesões focais hepáticas, avaliando-se o mapeamento vascular das formações 18. Esse recurso já foi utilizado na medicina humana para auxiliar a diferenciação de formações benignas e malignas 22. O direcionamento do diagnóstico das lesões hepáticas é fundamental na rotina oncológica, para permitir o estadiamento das neoformações, estabelecer o tratamento e avaliar o seu prognóstico 18. A ultrassonografia Doppler, mediante a arquitetura dos vasos na formação e dos parâmetros do fluxo, pode detectar alguns sinais de malignidade das lesões 23. Na medicina humana já foram descritos padrões de vascularização no interior e na periferia das formações, capazes de permitir a diferenciação do carcinoma hepatocelular de outras neoformações hepáticas 24,25. A distribuição central foi observada com maior frequência em carcinomas hepatocelulares, padrão periférico em nódulos metastáticos, e a ausência de sinal foi mais comum nas hiperplasias nodulares 18,24,25.

 

Contraste por microbolhas

A ultrassonografia com contraste de microbolhas tem sido utilizada para otimizar a acurácia da avaliação das lesões focais hepáticas. Na medicina humana, esse recurso pode ser empregado quando as características das formações ao modo-B não são suficientes para o diagnóstico. Algumas das formações hepáticas foram caracterizadas como hemangiomas, hiperplasia nodular, adenoma, nódulo degenerativo, gordura focal, carcinoma hepatocelular, colangiocarcinoma e metástases 26. A ultrassonografia é realizada por meio da injeção intravenosa do contraste, para a observação de sua perfusão tecidual, e de sua distribuição nas lesões, em diferentes fases hemodinâmicas. Em cães, a ultrassonografia foi empregada na avaliação de lesões focais hepáticas com o emprego do contraste de microbolhas, e o padrão de realce foi caracterizado nas fases arterial, portal e parenquimatosa. Observou-se que carcinoma hepatocelular apresentou hiperrealce na fase arterial e hiporrealce na fase portal; o colagiocarcinoma apresentou hiporrealce nas fases arterial e portal e na fase arterial; os carcinomas apresentaram hipervascularização, enquanto nenhuma das outras lesões apresentou essa característica 27. O tipo de realce na fase arterial também foi categorizado, e variou de acordo com o tipo tumoral (realce radial, realce vascular dismórfico, realce heterogêneo difuso, realce homogêneo difuso, realce fino, realce periférico e hiporrealce) 27. As hiperplasias nodulares não apresentaram realce nas fases arterial e venosa, portanto, verificou-se que o contraste de microbolhas pode ter grande utilidade na diferenciação de lesões focais malignas e benignas, e a característica do realce na fase parenquimatosa possui tanto valor quanto a fase portal nesta diferenciação, e é possível sugerir o tipo tumoral 27. Em período semelhante, as lesões focais hepáticas foram caracterizadas com o emprego do contraste de microbolhas nas fases vascular (arterial e portal) e parenquimatosa 28. Foram avaliadas cinco hiperplasias nodulares e quinze formações malignas (sendo a maioria carcinomas hepatocelulares), diagnósticadas ao exame citológico ou histopatológico; todas as lesões benignas eram isoecogênicas ao parênquima sadio na fase parenquimatosa, sendo que a maioria das formações malignas eram hipoecogênicas. Na fase arterial, a maioria das lesões benignas eram isoecogênicas ao parênquima, já a maior parte das malignas era hiperecogênica, e poucas hipoecogênicas.  Demonstrou-se que a avaliação da ecogenicidade das lesões focais hepáticas após a injeção do contraste de microbolhas pode auxiliar na diferenciação de lesões benignas e malignas nas fases arterial e parenquimatosa 28.

A análise de 185 casos retrospectivos e prospectivos, incluindo apenas lesões malignas como carcinomas e colangiocarcinomas hepatocelulares e menos frequentemente sarcomas e carcinomas neuroendócrinos, constatou que os carcinomas hepatocelulares apresentaram hiperrealce na fase arterial na maioria dos casos, porém também apresentaram hiporrealce ou ausência de realce nesta mesma fase. Os colangiocarcinomas apresentaram variadas características de realce. Os carcinomas tiveram também diferentes graus de realce, porém a sua ausência foi a característica mais frequente. Os nódulos metastáticos apresentaram hiperrealce na fase arterial e hiporrealce na fase venosa como caraterística mais comum, porém também ocorreram muitas variações. A partir desses dados, foi construído um fluxograma, ou árvore de decisão de acordo com as características do realce nas diferentes fases do tipo tumoral. Concluíram que a utilização do contraste de microbolhas não deve ser o único recurso empregado para diferenciar lesões malignas hepáticas caninas, sendo necessária a avaliação citológica ou histopatológica para o estabelecimento do diagnóstico definitivo 29.

 

Tomografia computadorizada

A TC oferece informações relevantes sobre todo o parênquima hepático. Nesta modalidade avançada, cada pixel da imagem representa um valor de atenuação da radiação pelo tecido, representado por um valor numérico, denominado Unidade Housfield (HU). Áreas com maior valor de HU são denominadas hiperatenuantes e as de menores valores são descritas como hipoatenuantes 10. A administração de meio de contraste iodado intravenoso é um procedimento rotineiro nos exames de TC abdominais. Nesse processo, após a aquisição das imagens sem contraste, é realizada a sua a injeção em um vaso periférico, e novas imagens são adquiridas em diferentes fases. Assim, determina-se um exame abdominal trifásico, contemplando as fases arterial, venosa (ou portal) e tardia (ou de equilíbrio) 10.

O parênquima hepático normal possui uma densidade homogênea, com uma atenuação (HU) variando de 60 a 70 em cães 10. No exame abdominal trifásico, sabe-se que o parênquima hepático sadio possui um realce intenso e homogêneo 5,30,31. Desta forma, as lesões focais hepáticas podem ser detectadas, onde rapidamente todo o abdome é contemplado na fase arterial, venosa ou portal e tardia ou de equilíbrio 28. As formações hepáticas devem ser avaliadas à tomografia quanto às suas dimensões, formato (amorfo ou cístico), limites (bem ou mal definidos), atenuação (em relação ao parênquima hepático sadio), e realce após administração de contraste (homogêneo ou heterogêneo) 10.

A diferenciação das lesões focais hepáticas de ocorrência mais frequente, como hiperplasia nodular benigna, nódulos metastáticos e carcinoma hepatocelular, é necessária para a determinação do prognóstico e estabelecimento do tratamento, e o exame tomográfico trifásico pode contribuir para essa distinção 0. Na tentativa de promover tal diferenciação, foi constatado que o carcinoma hepatocelular possui caráter heterogêneo com realce hiper, iso e hipoatenuante nas fases arterial e venosa; a hiperplasia nodular possui característica homogênea com realce hiper e isoatenuante nas fases venosa e tardia; e os nódulos metastáticos apresentam caráter homogêneo com realce hipoatenuante nas fases arterial e portal 30.

Na caracterização de formações hepáticas primárias à TC, foi observado que os carcinomas hepatocelulares se apresentaram como grandes formações (com média de 105,5mm de diâmetro), apresentando lesões necróticas císticas, margens bem definidas, iso ou hipoatenuantes na fase arterial, porém com realce central e periférico nessa fase, e hipoatenuantes nas fases portal e tardia. Já os adenomas hepáticos foram observados como formações menores (média de 85,5mm de diâmetro), com margens bem definidas, apresentando realce difuso na fase arterial e realce periférico pouco frequente, apresentando-se como hiperatenuantes na fase portal. A hiperplasia nodular apresentou-se com menores dimensões (com média de 42mm de diâmetro), margens bem definidas e mais frequentemente como isoatenuante na fase tardia quando comparada a outras lesões 5.

A busca da diferenciação de lesões focais hepáticas ao exame tomográfico trifásico levou à associação do diagnóstico histológico com o grau de atenuação das formações nas diferentes fases (pré-contraste, fase arterial, portal e tardia). Dentre as lesões estudadas, foram incluídos carcinoma hepatocelular, degeneração hepática, inflamação, adenoma, hemagiossarcoma, hiperplasia nodular e colangiocarcinoma 4, das quais 55% eram constituídas por lesões benignas e 45% por lesões malignas. As lesões inflamatórias foram distintas do parênquima hepático, sendo hipoatenuantes nas fases portal e tardia. Os hemagiossarcomas foram hipoatenuantes ao parênquima normal nas fases pré-contraste e arterial e em relação às lesões benignas na fase arterial. Outras afecções mostraram atenuações variadas nas diferentes fases contrastadas, não sendo possível a sua diferenciação. Portanto, concluíram que o exame histopatológico desempenha papel fundamental nesta diferenciação 3.

Com o intuito de criar um algoritmo para predizer o tipo histológico da lesão focal hepática em cães baseando-se nas informações quali e quantitativas da TC nas fases pré-contraste e tardia, incluindo o carcinoma hepatocelular, a hiperplasia nodular e outras lesões benignas e malignas, foi construído um fluxograma para estreitar a lista de diferenciais das lesões focais hepáticas por meio do valor de HU pré e pós-contraste. Foi observado que as lesões com valores de HU maior que 145 têm maior tendência para benignidade (como a hiperplasia nodular), e lesões com HU menor que 145 eram mais sugestivas de malignidade 3.

A análise de 18 lesões benignas e 52 malignas, revelou que a mensuração do diâmetro máximo e a característica do pós-contraste na fase tardia foram critérios relevantes para a diferenciação das variações patológicas de lesões focais hepáticas em cães. O valor de 4,5cm como diâmetro máximo da formação foi considerado o valor de corte para o estabelecimento da diferenciação. Além do HU reduzido na fase tardia (<37), o realce heterogêneo nessa fase também sugere malignidade, uma vez que isso pode caracterizar áreas de necrose, comumente observadas nas formações malignas 14.

O estudo radiômico de formações hepáticas heterogêneas de cães, por meio da extração de diversas características da imagem tomográfica (como textura e contorno), delimitando-se uma área de interesse (ROI) incluindo toda a massa teve o objetivo de predizer a malignidade dessas lesões. Observou-se uma aplicação clínica significativa do método, na tentativa de validar a definição da etiologia das formações hepáticas, principalmente nas situações em que há contraindicações para o exame histopatológico e considerando-se a sua limitação de amostragem 15.

Formações hepáticas foram comparadas com metodologias de imagem diferentes 31. A avaliação de massas hepáticas de 44 cães com diagnóstico histopatológico por tomografia computadorizada e ultrassonografia ao modo-B, doppler colorido, de amplitude e pulsado, revelou que a atenuação (HU) da formação e do parênquima normal foi obtida por meio da determinação de uma área de interesse (ROI), em uma região homogênea. O estudo permitiu a construção de equações considerando-se o menor valor de atenuação da formação na fase tardia (“A”), e o maior valor na fase venosa (“B”), para uma possível diferenciação entre lesões benignas e malignas. O maior resultado obtido após aplicação das fórmulas apresentadas a seguir indica se a lesão tem maior probabilidade de ser maligna ou benigna 31:

Fórmula 1: 

Lesão maligna: – 0,835 + (0,027 x A) – (0,013 x B)

Lesão benigna: – 6,301 + (0,074 x A) – (0,064 x B)

Fórmula 2: 

Lesão maligna: (0,016 x A) – 0,76

Lesão benigna: (0,119 x A) – 4,571

 

A utilização dessas equações apresentou uma maior sensibilidade quando comparada à acurácia da ultrassonografia (considerando-se áreas cavitárias das lesões como características de malignidade) 31.

Uma metanálise realizada com informações referentes à diferenciação de lesões hepáticas benignas e malignas com o emprego da tomografia computadorizada em cães revelou que ainda não há um consenso sobre a real contribuição desse exame para tal distinção. As informações qualitativas consideradas contemplaram margens bem definidas, presença de cápsula, linfonodos anormais e heterogeneidade do contraste nas fases arterial, portal e tardia. Já as informações quantitativas foram dimensões máximas, volume elipsoide, atenuação do fígado na fase pré-contraste, e nas fases arterial, portal e tardia. Maiores dimensões e volume e baixas atenuações foram mais comumente observadas nas lesões malignas 32.

Diante das características das lesões focais hepáticas já avaliadas com o emprego de diferentes modalidades de diagnóstico por imagem, o presente relato foi delineado para descrever os achados tomográficos qualitativos e quantitativos e os achados ultrassonográficos ao modo-B, Doppler e contraste por microbolhas de lesão focal hepática em um cão.

 

Relato de caso

Um cão macho, da raça golden retriever, de 13 anos de idade, com histórico de alterações dermatológicas (dermatite atópica) e achado de exame ultrassonográfico de formação hepática única, foi encaminhado à oncologista treze meses após o exame, quando se iniciaram os sinais clínicos de emagrecimento. Para fins de estadiamento da lesão focal, foi solicitado novo exame ultrassonográfico abdominal. Foi realizada a ultrassonografia abdominal total com a utilização de um aparelho GE®, modelo LogiqE R7 a, e transdutor convexo multifrequencial. O paciente foi posicionado em decúbito dorsal com a utilização de uma calha. Ele passou por tricotomia do abdome ventral, desde a cartilagem xifoide até a região púbica e foi aplicado gel de contato. Durante a avaliação hepática foram observados dimensões aumentadas, contornos definidos, margens regulares, ecogenicidade aumentada difusamente e lesões focais. Destacou-se a presença de uma formação arredondada, hiperecogênica e heterogênea, com discreto mapeamento central ao doppler colorido, medindo 6,65 x 5,51 x 6,52cm (volume elipsoide: 124,94cm³), partindo da região de lobos esquerdos, adjacente ao estômago; uma de 3,6 x 3,14 x 3,81cm (volume elipsoide: 22,52cm³), em região de lobo medial direito; e uma heterogênea, perfazendo um total de cerca de 8,63 x 5,57 x 6,57cm (volume elipsoide: 165,17cm³) (Figuras 1 e 2). Em comparação ao exame ultrassonográfico prévio, observou-se aumento do número e dimensões das formações.

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Figura 1 – Imagem ultrassonográfica ao modo-B do fígado de cão, com a utilização de transdutor microconvexo de 8 MHz, de formação hepática ao corte transversal, de contornos definidos, hiperecogênica e “grosseira”, observada em topografia de lobos esquerdos, adjacente ao estômago. Formação delimitada com “calipers”. Créditos: Georgea Bignardi Jarretta

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Figura 2 – Imagem ultrassonográfica ao modo-B do fígado de cão, com a utilização de transdutor microconvexo de 8 MHz, de formação hepática ao corte longitudinal, de contornos definidos, heterogênea, observada em topografia de lobos direitos. Formação delimitada com “calipers”. Créditos: Georgea Bignardi Jarretta

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A partir dessas informações, foi solicitada a realização de uma tomografia computadorizada abdominal trifásica, no intuito de se observar o comportamento do meio contraste nas lesões focais durante as diferentes fases, e adicionar dados complementares em relação às formações, como parte do protocolo adotado pela oncologista.

A tomografia computadorizada (TC) do abdome foi realizada em aparelho GE®, helicoidal multislice b, nas fases pré e pós administração intravenosa de meio de contraste. O paciente foi anestesiado com protocolo específico (2mcg/kg de dexmedetomidina c, 0,1mg/kg de butorfanol d e 1mg/kg de ketamina e, indução com propofol f na dose de 5mg/kg e manutenção com isofluorano g 1%), e posicionado em decúbito ventral. Foram adquiridas seis séries do estudo que incluíram o escanograma e séries transversais (filtros macio e duro). Para a avaliação, foram realizadas reconstruções multiplanares das séries com 1,25mm de espessura. Foram observadas três formações de atenuação de partes moles com áreas de fluido de permeio, com realce heterogêneo ao contraste, de limites definidos, contornos regulares e dimensões variadas, localizadas no lobo lateral e medial direitos, e processo papilar do lobo caudado. A formação no lobo lateral direito fazia íntimo contato com a parede lateral direita da vesícula biliar, medindo cerca de 5,3cm x 4,6cm x 4cm (A x L x C – altura x largura x comprimento). A formação do lobo medial direito mediu cerca de 5,7cm x 6,1cm x 10,9cm (A x L x C) e sua margem medial fazia discreto contato com a parede caudal da vesícula biliar e com o lobo direito do pâncreas. Já a lesão focal do processo papilar do lobo caudado mediu cerca de 7,8cm x 7,9cm x 8,6cm (A x L x C) e suas bordas faziam discreto contato, com plano de separação evidente, com a veia porta e parede gástrica, promovendo deslocamento do estômago para a esquerda (Figuras 3 a 6). Não foram identificadas efusão peritoneal e linfonodopatias abdominais.

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Figura 3 – Imagem de TC abdominal de cão na fase pré-contraste, em corte transversal, na altura de T12, com janela abdome e filtro macio, demonstrando áreas de menor atenuação em processo papilar de lobo caudado (setas azuis). À direita da imagem, lado esquerdo do paciente. Créditos: Cinthia Keiko Souto

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Figura 4 – Imagem de TC abdominal de cão na fase arterial, em corte transversal, na altura de T12, com janela abdome e filtro macio, demonstrando formações hepáticas de realce heterogêneo à captação do contraste, em lobo lateral direito (seta vede) e processo papilar de lobo caudado (seta azul). À direita da imagem, lado esquerdo do paciente. Créditos: Cinthia Keiko Souto

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Figura 5 – Imagem de TC abdominal de cão na fase venosa, em corte transversal, na altura de T12, com janela abdome e filtro macio, demonstrando formações hepáticas hipoatenuantes, de realce discretamente heterogêneo à captação do contraste, em lobo lateral direito (seta vede) e processo papilar de lobo caudado (seta azul). À direita da imagem, lado esquerdo do paciente. Créditos: Daniel Salles

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Figura 6 – Imagem de TC abdominal de cão na fase de equilíbrio, em corte transversal, na altura de T12, com janela abdome e filtro macio, demonstrando formações hepáticas hipoatenuantes (setas azuis). À direita da imagem, lado esquerdo do paciente. Créditos: Daniel Salles

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Como impressões diagnósticas, relatou-se presença de formações hepáticas, compatíveis com processo neoplásico, tendo processo hiperplásico ou degenerativo como hipóteses diferenciais.

As atenuações (valores de HU) foram mensuradas no parênquima sadio e na maior lesão. Considerando-se a heterogeneidade das formações, foram mensurados os valores de HU nas áreas de maior e menor realce (sendo as áreas hipoatenuantes as mais extensas na lesão), obtendo-se suas médias. As atenuações foram obtidas nas fases pré-contraste, arterial, venosa e tardia (Figuras 7 e 8). Estes valores são apresentados na Figura 9.

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Figura 7 – Imagem de TC abdominal de cão na fase venosa, em corte transversal, na altura de T12, com janela abdome e filtro macio, demonstrando mensurações do HU em formação hepática em lobo papilar, na porção de maior e menor atenuação (ROIs). À direita da imagem, lado esquerdo do paciente. Créditos: Georgea Bignardi Jarretta

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Figura 8 – Imagem de TC abdominal de cão na fase tardia, em corte transversal, na altura de T12, com janela abdome e filtro macio, demonstrando mensurações do HU em formação hepática em lobo papilar na porção de maior e menor atenuação (ROIs). À direita da imagem, lado esquerdo do paciente. Créditos: Georgea Bignardi Jarretta

 

  Parênquima normal Lesão de maior realce Lesão de menor realce Lesão de valor médio
Pré-contraste 66,71 77,73 49,64 63,68
Arterial 61,87 124,61 48,7 86,65
Venosa 107,42 149,76 51,31 100,53
Tardia 108,95 124,33 55,66 89,99
Figura 9 – Valores de HU nas áreas de maior e menor realce do contraste nas fases pré-contraste, arterial, venosa e tardia

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Na tentativa de estreitar as possibilidades diagnósticas, foram aplicadas as mensurações, cálculos e equações sugeridas 31. O menor valor de HU absoluto da lesão na fase tardia foi 6,02; portanto, sugestivo de malignidade (<37). Aplicando-se as duas fórmulas que utilizam o menor valor de atenuação da formação na fase tardia e o maior valor na fase venosa (55,66 e 149,76, respectivamente), observou-se uma maior probabilidade de malignidade da lesão de acordo com a primeira fórmula e de benignidade pela segunda.

Naquele momento, cogitou-se a realização do exame histopatológico para obtenção de diagnóstico definitivo, contudo, os exames laboratoriais demonstravam uma anemia importante e aumento relevante das enzimas hepáticas, desfavorecendo a realização do exame. Diante de tal quadro clínico, da presença de mais de uma formação hepática e da resistência do tutor em relação a uma possível intervenção cirúrgica, foi sugerido exame citológico para avaliação complementar, com a possibilidade de estreitamento da lista de diferenciais, considerando-se as suspeitas elencadas com a ultrassonografia e a TC. Logo após a realização do exame tomográfico, foi realizada a citologia aspirativa por agulha fina, guiada por ultrassonografia, com a obtenção de quatro amostras, a partir de duas formações (à esquerda e à direita), coradas por panóptico rápido. Os achados morfológicos indicaram carcinoma hepático bem diferenciado, hiperplasia nodular hepática e adenoma hepático como hipóteses diagnósticas.

Ainda visando acrescentar informações sobre a natureza e comportamento das lesões hepáticas observadas e seguindo protocolo adotado pela oncologista responsável pelo caso, foi realizado novo exame ultrassonográfico, acrescido da técnica de contraste por microbolhas. Previamente à injeção do contraste, foi realizada a avaliação ao doppler colorido das formações, observando-se a existência de distribuição vascular com padrão em manchas e efeito mecânico desviando o trajeto das veias hepáticas adjacentes (Figura 10).

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Figura 10 – Imagem ultrassonográfica de fígado de cão ao doppler colorido, com a utilização de transdutor microconvexo, de formação hepática com distribuição vascular com padrão em manchas. Créditos: Cibele Figueira Carvalho

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Na técnica contrastada dinâmica, foram contempladas três fases: arterial (10 a 20 segundos), portal (30 a 40 segundos), e venosa (“wash-out” aos 120 segundos). Duas das três formações foram avaliadas de maneira independente. A lesão focal em lobo medial direito (N1) apresentou realce discreto da lesão focal aos 16 segundos na fase arterial, hiporrealce na fase portal e isorrealce na fase venosa. A maior formação (N2), hiperecogênica e heterogênea (com área central de necrose e fibrose periférica), apresentou realce da lesão focal aos 19 segundos na fase arterial, hiperrealce aos 27 segundos na fase portal, e hiporrealce a partir de 120 segundos (wash out tardio) na fase venosa. Nas impressões diagnósticas, a primeira lesão descrita (N1) apresentou planos de clivagem bem definidos e padrão hemodinâmico sugestivo de malignidade (wash in precoce e wash out precoce). A maior formação (N2), possuía área de necrose central e fibrose periférica, produzindo comportamento hemodinâmico diferente (wash in precoce e wash out tardio), porém também sugestivo de malignidade (Figuras 11 e 12).

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Figura 11 – Imagem ultrassonográfica de fígado de cão com contraste por microbolhas da formação N1, demonstrando hiporrealce na fase portal (seta à direita da imagem). Créditos: Cibele Figueira Carvalho

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Figura 12 – Imagem ultrassonográfica de fígado de cão com contraste por microbolhas da formação N2, demonstrando hiperrealce na fase portal (seta à direita da imagem). Créditos: Cibele Figueira Carvalho

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Somando-se as informações obtidas pelos exames ultrassonográficos (modo B, Doppler e contrastado), pela TC e pela citologia aspirativa, e diante a impossibilidade da realização do exame histopatológico, considerou-se presuntivamente a hipótese de processo neoplásico hepático maligno, instituindo-se tratamento quimioterápico. Houve evolução desfavorável do quadro clínico, vindo o paciente a óbito após dois meses do início da terapia.

 

Discussão

O presente relato refere-se a um cão golden retriever de 13 anos idade com lesão focal hepática. Golden retriever é uma raça com maior predisposição a desenvolvimento de neoplasias 6, e cães idosos possuem maior predisposição a neoformações focais hepáticas 7.

Ao exame ultrassonográfico modo-B, as lesões encontradas no presente relato apresentaram-se hiperecogênicas e heterogêneas, com grandes dimensões e volume elipsoide elevado. Formações únicas ou multifocais hiperecogênicas ou mistas podem sugerir carcinoma hepatocelular 9; e sabe-se que, apesar da hiperplasia nodular ocorrer de maneira mais frequente, normalmente são lesões menores do que 5cm e apresentam aspecto hipoecogênico 9,16-18, diminuindo a possibilidade de as lesões encontradas no presente relato possuírem caráter benigno. Já foi demonstrado que a presença de efusão peritoneal é um achado que possui relação positiva com malignidade 20, e esse achado não foi detectado no presente relato. O tamanho das formações encontradas neste trabalho corrobora a literatura que afirma que as lesões malignas possuem maiores dimensões 22. Também tem sido observado que lesões heterogêneas e maiores do que 4,1cm têm uma maior possibilidade de malignidade 21.

As lesões hepáticas do presente estudo apresentaram mapeamento em mancha ao Doppler colorido, e tal informação pode ser relevante para auxiliar na diferenciação de formações benignas e malignas, direcionando o diagnóstico das lesões para estabelecer um tratamento e avaliar seu prognóstico 18,22.

Ambas as lesões avaliadas ao exame ultrassonográfico com contraste por microbolhas apresentaram realce na fase arterial, sugerindo uma maior probabilidade de malignidade, corroborando a literatura pesquisada 27,29. Já a fase de wash-out apresentou-se de maneira precoce em uma das formações e tardia em outra, e nessa, a característica heterogênea sugestiva de necrose central e fibrose periférica pode proporcionar tal padrão de comportamento do contraste. Lesões benignas são isoecogênicas ao parênquima sadio na fase parenquimatosa, e lesões malignas são hipoecogênicas 28. Essa característica de hiporrealce na fase parenquimatosa foi observada na maior lesão no presente estudo; contudo a formação N1 apresentou isorrealce nessa mesma fase. Observa-se que, assim como afirma a literatura 27,29, o contraste de microbolhas não deve ser o único recurso empregado para diferenciar lesões malignas hepáticas caninas, sendo necessária a avaliação citológica ou histopatológica para o diagnóstico definitivo.

As três formações hepáticas identificadas ao exame tomográfico possuíam dimensões entre 5 e 10cm. Sabe-se que as dimensões hepáticas à tomografia são parâmetros quantitativos que devem ser considerados como auxílio na diferenciação entre lesões benignas e malignas 5,32. Hiperplasias benignas possuem dimensões em média de 4,2cm de diâmetro e as formações de maiores dimensões e volume possuem maior possibilidade de malignidade 5,32. Essas observações sugerem tal hipótese diagnóstica para o caso em questão.

Todas as formações demonstraram realce heterogêneo na fase pós-contraste, o que pode sugerir carcinoma hepatocelular, corroborando a literatura 5,30 que descreve que as neoformações hepáticas podem apresentar lesões necróticas císticas, com margens bem definidas, e possuem realce hiper, iso e hipoatenuante nas fases arterial e venosa (portanto, caráter heterogêneo).

Extrapolando-se os valores de HU da formação nas diferentes fases de contraste para as fórmulas propostas 31, sugeriu-se malignidade em uma das equações e benignidade na outra. Considerando-se o menor HU da lesão na fase tardia 31, o presente relato obteve um valor que também propôs alta possibilidade de malignidade da formação.

O resultado do exame citológico foi carcinoma hepático bem diferenciado, hiperplasia nodular hepática e adenoma hepático como hipóteses diagnósticas; portanto, um resultado inconclusivo. É reconhecido que a análise citolológica é considerada um exame de triagem, e que o diagnóstico definitivo deve ser obtido pelo exame histopatológico (e muitas vezes complementado com avaliação imuno-histoquímica) 3. Contudo, a realização desse exame pode ser inviabilizada por alguns fatores individuais. No caso em questão, o paciente apresentava anemia significativa e comprometimento de função hepática que desfavoreciam o procedimento. Uma opção cirúrgica também já havia sido descartada pelo tutor no momento em que foi encaminhado para a oncologista. Portanto, optou-se por dar continuidade com outros recursos disponíveis e menos invasivos. O compilado de informações obtidas por diferentes exames de imagem foi o responsável pelo estreitamento das possibilidades diagnósticas.

Considerando-se as modalidades em particular, sabe-se que a ultrassonografia modo-B, apesar de amplamente utilizada, possui baixa acurácia no diagnóstico definitivo das lesões focais hepáticas, quando utilizada isoladamente. A utilização do Doppler colorido e do contraste por microbolhas como complemento a esse recurso pode estreitar a lista de diferenciais. Já a tomografia computadorizada abdominal trifásica pode contribuir de forma significativa no diagnóstico presuntivo dessas lesões, pois oferece uma possibilidade de avaliações quantitativas que acrescentam dados que, associados aos demais procedimentos, auxiliam na validação das possibilidades mais prováveis.

 

Considerações finais

As lesões focais hepáticas detectadas pelas modalidades de diagnóstico por imagem requerem o exame histopatológico para um diagnóstico definitivo. No entanto, na impossibilidade de sua realização, a associação da tomografia computadorizada qualitativa e quantitativa com outros exames de imagem, como a ultrassonografia modo-B, Doppler colorido e contraste com microbolhas, pode oferecer um diagnóstico presuntivo, estreitando a lista de possibilidades diagnósticas e auxiliando na escolha da conduta terapêutica do paciente.

 

Produtos utilizados

a) Aparelho de ultrassonografia modelo LogiqE R7. GE® HealthCare. São Paulo. SP

b) Aparelho de tomografia computadorizada helicoidal multislice Revolution ACTS VET, GE® HealthCare. São Paulo. SP

c) Dexdomitor. Zoetis. São Paulo. SP

d) Butorfin, Vetnil, Louveira, SP

e) Cetamin. Syntec. Santana de Parnaíba. SP

f) Lipuro. B Braun. São Gonçalo. RJ

g) Isoflurano. BioChimico. Cordovil. RJ

 

Referências

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