Ingredientes nutricionais para controle da epilepsia
Matéria realizada a partir de entrevista com Yuanlong Pan, BVM, Ph.D., pesquisador principal no Centro de Pesquisas da Nestlé Purina, de St. Louis, Missouri, EUA

A epilepsia é classificada em idiopática e sintomática. Ela é a causa mais comum de convulsões em cães, além das doenças hepáticas, renais, tumores, traumas e is que mias cerebrais ou toxinas. Tem prevalência de 0,5 a 0,7% na população canina em geral e de 1 a 2,6% na população encaminhada a hospitais.
A epilepsia idiopática, ou primária, não tem causa identificável, com possível predisposição genética e caráter hereditário. A primeira convulsão em cães com epilepsia idiopática se dá entre 1 e 5 anos de idade (às vezes, antes dos 6 meses). As raças com maior pre valência são lébrel-irlandês (18%), pastor-belga tervuren (17%), border terrier (13,1%), pequeno basset griffon da Vendeia (8,9%), spitz-finlandês (5,4%), spinone-italiano (5,3%) e labrador re triever (3,1%), além de beagle, keeshond, dachshund, pastor-ale mão, golden re triever, pastor de Shetland, braco-húngaro de pelo curto, boiadeiro-bernês e springer spaniel inglês. Não há predispo si ção de sexo em pastor-belga tervueren, border collie e border terrier. Há maior prevalência em machos de boiadeiro-bernês e lébrel-ir lan dês e fêmeas de pastor de Shetland.
A epilepsia sintomática, ou secundária, é causada por lesão na estrutura cerebral – tumor, isquemia ou cicatriz traumática.
Ingredientes e/ou componentes alimentares que favorecem o controle da epilepsia
As dietas cetogênicas tradicionais foram introduzidas nos anos 1920 para tratar crianças com epilepsia idiopática. São ricas em gorduras e pobres em proteínas e carboidratos, com proporções de até 4:1 de gordura contra proteína e carboidrato. Foi proposto que os corpos cetônicos têm efeitos anticonvulsivantes e antiepilépticos. A suplementação alimentar com triglicerídeos de cadeia média (TCM) ajuda a controlar a doença. Tecnicamente, os TCM são responsáveis pelo aumento dos níveis cerebrais de corpos cetônicos, que são metabólitos dos ácidos graxos. O metabolismo de ácidos graxos de cadeia longa (AGCL), libera dos dos triglicerídeos de cadeia longa (TCL) em corpos cetônicos é inibido pela disponibilidade de glicose. As dietas cetogênicas tradicionais devem ter alto teor de gorduras e baixo teor de proteínas e carboidratos. Dois corpos cetônicos, o acetoacetato e a acetona, têm efei tos anticonvulsivantes e antiepilépticos em mo delos animais de epi lepsia.
A redução do metabolismo de glucose cerebral em cães epilépticos jovens promoveu hipometabolismo da glicose nos córtices occipital, temporal e parietal. Em cães spitz-finlandeses com epilepsia idiopática se observou hipometabolismo da glicose em lobos frontal, parietal, temporal e occipital, cerebelo e hipocampo, em comparação com cães de con trole de mesma idade e raça.
Condução da investigação e efeito da dieta com TCM
Uma dieta cetogênica com 5,5% de óleo com TCMa foi testada em estudo alimentar cruzado, duplo-cego, randomizado e controlado por placebo. Cães com epilepsia idiopática e intratável receberam dieta de TCM ou dieta placebo por 3 meses (dia 1 ao dia 90 ± 2 d), seguindo-se uma respectiva troca subsequente de dieta por 3 meses adicionais (dia 90 ao dia 180 ± 2 d). Os cães foram tratados também com um ou dois medicamentos antiepilépticos (todos com fenobarbital e 18 também com brometo de potássio). Alguns cães receberam um terceiro medicamento antiepiléptico (um deles, Imepitoína, e quatro, Levetiracetam). Eram alimentados uma ou duas vezes ao dia em casa, sem restrição na ingestão de água. A quantidade diária foi calculada segundo o peso do cão, para que fosse suficiente para suas necessidades nutricionais.
21 cães concluíram o estudo, que mostrou frequência bem mais baixa (p = 0,02) de convulsões nos cães com a dieta teste, em comparação à dieta controle. 3 cães ficaram livres de convulsões, 10 tiveram redução de 50% ou mais nas convulsões e 5 uma redução de menos de 50%, nos 3 meses de estudo. A fre quên cia diária de convulsões também teve redução expressiva (p = 0,02) nos cães com a dieta teste. 17 cães reduziram os dias de convulsão por mês. Houve também frequência bem mais baixa (p = 0,01) de convulsões nos primeiros 30 dias em cães ali mentados com a dieta teste, em comparação com cães alimenta dos com a dieta de controle.
Modos de ação desses ingredientes em casos de epilepsia
Os mecanismos pelos quais as dietas cetogênicas e os TCMa causam efeitos antiepilépticos não são bem compreendidos. É possível que o acetoacetato e a acetona das dietas cetogênicas ou do metabolismo dos TCM melhorem o neurotransmissor inibitório (o ácido gama-aminobutírico) ou que os corpos cetônicos corrijam o hipometabolismo da glicose no cérebro de cães epilépticos ao fornecer às células cerebrais afetadas uma fonte alternativa de energia. Na dieta com TCM não se computou o efeito do ômega 3.
Um nível baixo de TCM (10% das calorias alimentares) na dieta pode potencializar a ação dos antiepilépticos e melhorar a gestão das convulsões em cães com epilepsia idiopática intratável.
a – Purina Pro Plan Neurologic Care
Referências recomendadas
WILDER, R. M. The effects of ketonemia on the course of epilepsy. Mayo Clinic Procedings, v. 2, p. 307-308. 1921.
CASAL, M. L. ; MUNUVE, R. M. ; JANIS, M. A. ; WERNER, P. ; HENTHORN, P. S. Epilepsy in Irish Wolfhounds. Journal of Veterinary Internal Medicine, v. 20, n. 1, p. 131-135. 2006.
PAN, Y. ; LARSON, B. ; ARAUJO, J. A. LAU, W. ; RIVERA, C. : SANTANA, R. : GORE, A. ; MILGRAM, N. W. Dietary supplementation with medium-chain TAG has long-lasting cognition-enhancing effects in aged dogs. British Journal of Nutrition, v. 103, n. 12, p. 1746-1754. 2010.
THOMAS, W. B. Idiopathic epilepsy in dogs and cats, Veterinary Clinics of North America: Small Animal Practice, v. 40, n.1, p. 161-179. 2010.
MCNALLY, M. A. ; HARTMAN, A. L. Ketone bodies in epilepsy. Journal Neurochemistry, v. 121, p. 28-35. 2012.
MONTEIRO, R. ; ADAMS, V. ; KEYS, D. ; PLATT, S. R. Canine idiopathic epilepsy: prevalence, risk factors and outcome associated with cluster seizures and status epilepticus. Journal of Small Animal Practice, v. 53, p. 526-530. 2012.
VIITMAA, R. ; HAAPARANTA-SOLIN, M. ; SNELLMAN, M. ; CIZINAUSKAS, S. ; ORRO, T. ; KUUSELA, E. ; JOHANSSON, J. ; VILANEN, T. ; JOKINEN, T. S. ; BERGAMASCO, L. ; METSÄHANKALA, L. Cerebral glucose utilization measured with high resolution positron emission tomography in epileptic Finnish Spitz dogs and healthy dogs. Veterinary Radiology Ultrasound, v. 55, n. 4, p. 453-461. 2014.
JOKINEN, T. S. ; HAAPARANTA-SOLIN, M. ; VIITMAA, R. GRÖNROOS, T. J. ; JOHANSSON, J. ; BERGAMASCO, L. ; SENELLMAN, M. ; METSÄHANKALA, L. FDG-PET in healthy and epileptic Lagotto Romagnolo dogs and changes in brain glucose uptake with age. Veterinary Radiology and Ultrasound, v. 55, n. 3, p. 331-341. 2014.
LAW, T. H. ; DAVIES, E. S. ; PAN, Y. ; ZANGHI, B. ; WANT, E. ; VOLK, H. A. A randomised trial of a medium-chain TAG diet as treatment for dogs with idiopathic epilepsy. British Journal of Nutrition, v. 114, n. 9, p. 1438-1447. 2015.
HÜLSMEYER, V. I. ; FISCHER, A. ; MANDIGERS, P. J. J. ; DERISIO, L. ; BERENDT,M. ; RUSBRIDGE, C. ; BHATTI, S. F. M ; PAKOZDY, A. ; PATTERSON, E. E.; PLATT, S. ; PACKER, R. M. A.; VOLK, H. A. International Veterinary Epilepsy Task Force’s current understanding of idiopathic epilepsy of genetic or suspected genetic origin in purebred dogs. BMC Veterinary Research, v. 11. p. 175. 2015.