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Projeto Tatu-canastra

Monitoramento contínuo para compreender a dinâmica populacional da espécie

Matéria escrita por:

Guto Akasaki

21 de maio de 2024


Tatu-canastra (Priodontes maximus) monitorado no Projeto Tatu-canastra.
Projeto Tatu-canastra / Icas

 

O Projeto Tatu-canastra (PTC), iniciado em 2010 na Fazenda Baía das Pedras, no Pantanal do Mato Grosso do Sul, simboliza um marco significativo nos esforços de conservação da vida selvagem no Brasil. Com o objetivo de desvendar os mistérios da ecologia, biologia, saúde e história natural do tatu-canastra (Priodontes maximus) por meio de métodos como armadilhas fotográficas, radiotransmissores e coleta de material biológico, o projeto representa um compromisso com a sustentabilidade ambiental e a preservação de espécies.

Ao longo de 13 anos do Projeto Tatu-canastra no Pantanal, foram capturados e monitorados 41 indivíduos, incluindo machos, fêmeas, jovens e adultos, um feito notável, dada a raridade da espécie, caracterizada por uma densidade populacional bastante baixa. Alguns, como Isabel, foram monitorados por mais de cinco anos, com observações quase mensais, enquanto outros foram acompanhados por períodos mais curtos, de cerca de um ou dois meses. Essa variação ocorreu devido à adaptação e ao desenvolvimento de metodologias ao longo do tempo para estudar essa espécie até então pouco conhecida.

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Exame clínico em um tatu-canastra (Priodontes maximus) realizado pelo médico-veterinário Danilo Kluyber na fazenda parceira Baía das Pedras, localizada em Nhecolândia, Pantanal, MS. Créditos: Projeto Tatu-canastra / Icas

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Além dos 41 indivíduos diretamente monitorados, também foi possível conhecer indiretamente outros animais por meio de armadilhas fotográficas colocadas no campo, que registraram a sua passagem sem que tivesse sido necessário capturá-los. Dessa forma, estima-se que há uma média de 7 a 8 indivíduos por cada 10 km² na área de estudo.

Esse trabalho de monitoramento contínuo, combinado com o uso de armadilhas fotográficas e radiotelemetria, permite não apenas conhecer os indivíduos, mas também compreender a dinâmica populacional da espécie.

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Exame clínico e colheita de material biológico em um tatu-de-rabo mole (Cabassous unicinctus unicinctus) realizados pelos médicos-veterinários Carolina Lobo e Danilo Kluyber na fazenda parceira parceira Baía das Pedras, localizada em Nhecolândia, Pantanal, MS. Créditos: Projeto Tatu-canastra / Icas

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A contribuição do projeto vai além da pesquisa científica. Cerca de 100 estagiários e voluntários foram capacitados para atuar na conservação da fauna silvestre. A iniciativa de formar uma brigada de incêndio comunitária, envolvendo 22 propriedades rurais e protegendo 16.000 km² do Pantanal, demonstra uma abordagem inovadora para a conservação ambiental, combinando esforços de pesquisa com ações práticas de preservação.

Em 2016, foi criado o Instituto de Conservação de Animais Silvestres (Icas), e o que era um projeto tornou-se o Programa de Conservação do Tatu-canastra (PTC), expandindo os estudos para o Cerrado sul-mato-grossense.

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Colocação rádio transmissor GPS em tatu-canastra (Priodontes maximus) realizado pela equipe de médicos-veterinários do projeto na fazenda parceira Santa Lurdes, localizada em Nova Andradina, MS. Créditos: Projeto Tatu-canastra / Icas

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Uma situação importante que ocorreu com a espécie foi sua adaptação à dieta de larvas de abelhas, em resposta à escassez de alimentos causada pelo desmatamento. Acredita-se que uma das causas de os tatus buscarem por larvas de abelhas é a degradação do Cerrado – ou seja, os cupins e as formigas ficaram mais escassos, e eles encontraram nas larvas nas colmeias uma alternativa de alimento. A adaptação do tatu-canastra à dieta de larvas de abelhas, em resposta à escassez de alimentos causada pelo desmatamento, levou ao desenvolvimento do Projeto Canastras e Colmeias. Essa colaboração entre pesquisadores e apicultores resultou em um Guia de práticas de manejo e convivência (https://www.icasconservation.org.br/wp-content/uploads/2022/01/Guia-Praticas-de-Manejo-2022.pdf), que enfatiza soluções para o conflito entre a preservação da espécie e as atividades apícolas. As medidas de mitigação não impedem que o tatu se alimente, mas incentivam-no a continuar explorando a área em busca dos alimentos que fazem parte da sua dieta, como as formigas e os cupins. Essas medidas promovem uma convivência mais harmoniosa com os apicultores, que, assim como os tatus, buscam os lugares de mata nativa preservada para instalar suas colmeias, pois as produções das abelhas são melhores em ambientes de floresta.

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Monitoramento anestésico de tatu-peba (Euphractus sexcinctus) realizado pela MV Mayara Caiaffa na fazenda parceira Baía das Pedras, localizada em Nhecolândia, Pantanal, MS. Créditos: Projeto Tatu-canastra / Icas­

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O selo Amigo do Tatu-canastra é uma iniciativa que promove a conservação por meio do incentivo a práticas sustentáveis, beneficiando tanto a biodiversidade quanto a economia local. Para ter a certificação de amigo do tatu-canastra, o apicultor precisa ter sua produção na área de ocorrência do animal e adotar algumas medidas de mitigação não letais, que constam no Guia de práticas de manejo e convivência – assim ele vai evitar que os tatus predem suas colmeias sem causar nenhum dano físico a eles. Em alguns casos, instalam-se armadilhas fotográficas para comprovar a ocorrência desses animais e também para analisar o comportamento deles diante daquelas colmeias e assim avaliar, junto com os apicultores, qual seria a medida com melhor custo-benefício para que eles possam produzir em harmonia com os tatus-canastras.

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Acompanhamento da recuperação anestésica de tatu-canastra (Priodontes maximus) realizado pelo médico-veterinário Danilo Kluyber na fazenda parceira Baía das Pedras, localizada em Nhecolândia, Pantanal, MS. Créditos: Projeto Tatu-canastra / Icas

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A pesquisa efetuada no Parque Natural Municipal do Pombo (PNMP), no MS, e no Parque Estadual do Rio Doce (Perd), em MG, destaca a importância das unidades de conservação na proteção de espécies ameaçadas. Com registros significativos de indivíduos nessas duas unidades de conservação, fica evidente a necessidade de expandir estudos e esforços de conservação para garantir a sobrevivência do tatu-canastra, especialmente considerando o Cerrado e a Mata Atlântica, respectivamente, como dois biomas críticos para a espécie.

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Monitoramento anestésico de tatu-peba (Euphractus sexcinctus) realizado pelas MV Mayara Caiaffa e Carolina Lobo na fazenda parceira Baía das Pedras, localizada em Nhecolândia, Pantanal, MS. Créditos: Projeto Tatu-canastra / Icas

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Considerado um dos maiores remanescentes nativos do Cerrado do Mato Grosso do Sul, o Parque Natural Municipal do Pombo, localizado no município de Três Lagoas, vem se tornando referência de Unidade de Conservação (UC) no estado. Com cerca de 8 mil hectares, abriga uma vasta biodiversidade da maior savana das Américas, área de proteção integral, e tem como principal objetivo a conservação da fauna e da flora do Cerrado – bioma que vem sofrendo uma intensa expansão agrícola.

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Vista aérea do Parque Estadual do Rio Doce (Perd) no qual se realiza pesquisa com tatu-Canastra (Priodontes maximus). Créditos: Projeto Tatu-canastra / Icas

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Desde 2022, o Instituto de Conservação de Animais Silvestres (Icas), por meio do Projeto Tatu-canastra, em parceria com a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Agronegócio (Semea) da Prefeitura de Três Lagoas, vem realizando ações que visam compreender e estudar uma das últimas grandes populações de tatus-canastras no Cerrado sul-mato-grossense.

Em um ano de atividades nesse grande fragmento de vegetação nativa já foram instaladas 85 armadilhas fotográficas em toda a área do parque. A tecnologia dessas câmeras possibilita realizar o monitoramento da vida selvagem 24 horas por dia, registrando uma fauna riquíssima, que vai desde antas até pequenos pássaros em seu ambiente natural.

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Exame clínico de tatu-canastra (Priodontes maximus) realizado pelos médicos-veterinários Debora Yogui e Danilo Kluyber na fazenda parceira Baía das Pedras, localizada em Nhecolândia, Pantanal, MS. Créditos: Projeto Tatu-canastra / Icas

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O projeto já tem mais de 700 mil horas de monitoramento ininterrupto de fauna somente no Parque Natural Municipal do Pombo, e os pesquisadores já registraram e identificaram 69 espécies de animais no local, sendo 27 mamíferos, 37 aves e 5 répteis.

Na Mata Atlântica, a principal área de estudo é o Parque Estadual do Rio Doce (Perd), maior área contínua de mata nativa preservada em MG, que compreende quase 36 mil hectares e está localizado no Vale do Rio Doce, entre os municípios de Timóteo, Marliéria e Dionísio. No local já foram instaladas 56 armadilhas fotográficas e registradas mais de 400 imagens de tatu-canastra desde 2020, ano em que o projeto iniciou suas atividades na região.

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Colocação de rádio transmissor GPS em tatu-canastra (Priodontes maximus) realizado pelos médicos-veterinários Gabriel Massocato, Mayara Caiaffa e Carolina Lobo na fazenda parceira Baía das Pedras, localizada em Nhecolândia, Pantanal, MS. Créditos: Projeto Tatu-canastra / Icas

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Esse material já possibilitou a identificação de aproximadamente 40 indivíduos diferentes no parque. Pesquisadores do Icas acreditam que essa seja a última população viável da espécie no bioma e planejam expandir o estudo para a região do entorno do parque.

O tatu-canastra, um gigante solitário da América do Sul, enfrenta desafios consideráveis devido à perda de habitat e à baixa taxa de reprodução. Suas tocas, essenciais para muitas outras espécies, destacam o papel ecológico fundamental que ele desempenha como engenheiro do ecossistema. O Programa de Conservação do Tatu-canastra (PTC) é mais do que um projeto de pesquisa; é uma luz de esperança para a conservação da biodiversidade. Por meio da ciência, da educação, da política pública e da cooperação comunitária, os pesquisadores buscam por um futuro em que a coexistência harmoniosa entre os seres humanos e a vida selvagem seja não apenas possível, mas uma realidade próspera.

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Exame clínico em um tamanduá-bandeira (Myrmecophaga tridactyla) realizado pela equipe de médicos-veterinários do Projeto Tatu-canastra na fazenda parceira Santa Lurdes, em Nova Andradina, MS. Créditos: Projeto Tatu-canastra / Icas

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Estágios

No site https://www.icasconservation.org.br/vagas/ os interessados em fazer voluntariado ou estágio podem se cadastrar no banco de dados, e, havendo vagas, os coordenadores entram em contato de acordo com o perfil de cada tipo de vaga.

 

Projeto Tatu-canastra

https://www.icasconservation.org.br/projetos/tatucanastra/