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Avanços da medicina veterinária do coletivo no Brasil

Parte 2 – Medicina veterinária de povos originários e tradicionais, de desastres, de abrigos e legal

Além dos cuidados e atendimentos diretos aos animais, o trabalho da medicina veterinária do coletivo direcionado aos povos originários e tradicionais envolve a orientação das crianças e jovens dessas comunidades. Créditos: Lucas Belchior Além dos cuidados e atendimentos diretos aos animais, o trabalho da medicina veterinária do coletivo direcionado aos povos originários e tradicionais envolve a orientação das crianças e jovens dessas comunidades. Créditos: Lucas Belchior

Medicina veterinária de povos originários e tradicionais

Mais recentemente, a medicina veterinária de povos originários e tradicionais (caiçaras, ciganos, quilombolas e ribeirinhos, dentre outros) encontrou forças e se fez parte da medicina veterinária do coletivo. Ao longo da história, os povos tradicionais brasileiros têm sido vítimas de repressão e racismo ambiental, tendo-se criado uma dívida que afeta todos os cidadãos do nosso território 1. A exclusão desses povos e a falta de compreensão dos seus modos de vida, bem como dos impactos da sua colonização, são problemas estruturais que ainda permeiam nosso pensamento e nos impedem de entender plenamente o contexto do outro 2. Dessa forma, muitos impactos à saúde coletiva nas comunidades tradicionais são oriundos de históricos de intercorrências, de práticas hegemônicas e da falta de consideração à garantia de um meio ambiente saudável. A atuação perante esse cenário demanda o entendimento do conceito de saúde única, que tem distintas concepções, principalmente com base nas práticas tradicionais que são pouco consideradas nesse contexto, sendo essencial o reconhecimento desse histórico e das relações entre pessoas com o seu meio para a tomada de decisões adequadas 3. Isso levanta questões importantes: quem está realmente cuidando de forma integrada da saúde humana, animal e ambiental, além dos esforços valorosos dos povos em seus próprios territórios? E como as instituições de Ensino Superior e os conselhos de classe estão contribuindo para esses processos?

Apesar das adversidades, é possível constatar alguns avanços nas pesquisas realizadas em territórios indígenas, que abordam questões relevantes para a saúde integrada, com especial enfoque em doenças zoonóticas 4,5, mudanças climáticas 6,7 e nas interações entre seres humanos e animais 8,9. Nessa jornada rumo a um pensamento coletivo, é fundamental dar protagonismo aos povos tradicionais, ao mesmo tempo em que a população não tradicional assume um papel de coadjuvante comprometido 10. O objetivo é construir uma nova história na perspectiva da saúde única, abrangendo o combate ao racismo ambiental, à insegurança alimentar e nutricional e à transmissão de doenças zoonóticas e negligenciadas, bem como garantir que os povos tradicionais não sejam mais invisíveis. É crucial entender que esse trabalho é interdisciplinar e multidisciplinar e que sua efetivação só é possível com a participação ativa da sociedade como um todo. Assumir um compromisso coletivo, dando as mãos uns aos outros e investindo energia no apoio proativo a essa causa, é o caminho para a construção de um futuro mais justo e equitativo para todos, respeitando e valorizando a diversidade, as diferentes formas de vida e os direitos dos povos tradicionais brasileiros.

Nesse contexto, um exemplo de projeto de atuação com comunidades tradicionais é o do Barco Saúde Única, que atua no litoral do Paraná nos municípios de Guaraqueçaba, Antonina e Morretes, representando uma iniciativa voluntária e transformadora dentro do conceito da saúde única. O projeto desenvolve um programa de manejo populacional de cães e gatos em comunidades remotas, levando cuidados veterinários às comunidades tradicionais. Além de atuar com ações clínicas em medicina veterinária preventiva e mutirões de castração, o projeto também abrange educação em saúde, promovendo a conscientização sobre doenças de origem zoonóticas e práticas saudáveis. Essa abordagem holística não apenas contribui para a melhora da saúde física dos moradores e dos animais como também fortalece os laços e o bem-estar da comunidade.

A experiência do projeto Barco Saúde Única demonstra a importância de adaptar os serviços de saúde às realidades locais e de superar desafios geográficos e infraestruturais. Ao proporcionar um acesso mais equitativo à saúde, o projeto ajuda a mitigar os desafios socioambientais e evidencia a importância de iniciativas voluntárias continuadas, centradas na comunidade. A abordagem do Barco Saúde Única busca preencher uma lacuna crucial no sistema de saúde, além de destacar a necessidade de soluções flexíveis e culturalmente sensíveis ao enfrentar questões de saúde em contextos complexos.

 

Medicina de desastres

Os desastres que ocorreram no Brasil nos últimos anos causaram grandes impactos a diversas regiões e municípios, atingindo áreas populacionais urbanas e rurais e colocando em risco e vulnerabilidade animais de companhia, de produção e silvestres. Ao analisar a Política Nacional de Defesa Civil, observa-se que são cinco as dimensões estabelecidas para a proteção e defesa civil em desastres: prevenção, mitigação, preparação, resposta e recuperação, devendo as ações a elas vinculadas estar previamente planejadas nos Planos de Proteção e Defesa Civil nacional, estaduais e municipais 11; entretanto, nacionalmente, em poucos casos os entes federativos incluem os animais nos seus planos de contingenciamento de desastres.

 

Atendimento médico-veterinário de onça-pintada (Panthera onca) resgatada em incêndio florestal. Créditos: Paula Helena Santa Rita

 

Diante desse quadro, é necessário formular diretrizes voltadas aos animais em áreas de risco e aos afetados pelos desastres, devendo essas diretrizes ser propostas para integrar os Planos de Proteção e Defesa Civil das diversas esferas. Nelas devem ser estabelecidas ações que vão do levantamento das populações animais em áreas de risco à previsão de abrigos, além de protocolos para a devolução ou o encaminhamento dos indivíduos ou rebanhos atingidos, passando pela identificação e/ou estruturação de equipes de resgate técnico e pelo mapeamento de profissionais e estabelecimentos médico-veterinários contratados ou voluntários para atendimento veterinário pós-salvamento, entre outras.

Como iniciativa direcionada a orientar os profissionais que atuam na medicina veterinária de desastres e que pode colaborar na construção dessas diretrizes, o Conselho Federal de Medicina Veterinária publicou o Plano Nacional de Contingência de Desastres em Massa Envolvendo Animais 12. Nele, por meio de conceitos da medicina veterinária do coletivo, são abordados temas como os planos para salvaguardar a integridade dos animais afetados, a investigação das causas dos desastres e respectivas consequências aos animais e ainda a preservação da cadeia de custódia de provas materiais que serão utilizadas para possíveis responsabilizações cíveis e criminais.

 

Detalhe das patas queimadas de onça-pintada (Panthera onca) em decorrência de incêndio florestal, submetida a atendimento médico-veterinário. Créditos: Paula Helena Santa Rita

 

Outro aspecto importante é a necessidade da intervenção integrada dos profissionais nos desastres, especialmente com o Sistema de Comando de Incidente (SCI). Atenta a isso, a Comissão Nacional de Desastres em Massa Envolvendo Animais, do Conselho Federal de Medicina Veterinária, propôs a normatização da atividade dos médicos-veterinários, zootecnistas e grupos de resgate técnico nessa área, resultando na publicação da Resolução CFMV nº. 1511/2023, que “institui diretrizes para a atuação de médicos-veterinários e zootecnistas em desastres em massa envolvendo animais domésticos e selvagens” 13.

A normativa determina que os grupos de resgate de animais e profissionais devem trabalhar sob o comando do SCI, prevê a criação de bancos de cadastros de médicos-veterinários e zootecnistas voluntários, institui o Posto Médico-Veterinário Avançado (PMVA) e suas características, normatiza a realização de procedimentos clínicos e cirúrgicos, anestésicos e de contenção química in loco e destaca que o transporte de espécimes domésticos ou selvagens sob anestesia, contenção química (sedação) ou com administração de medicamentos por via parenteral deverá ser acompanhado por médico-veterinário, consolidando a medicina veterinária em desastres como uma nova área da medicina veterinária do coletivo. 

 

Medicina de abrigos 

A medicina de abrigos – área da medicina veterinária destinada ao estudo dos fatores que influenciam a manutenção de animais no coletivo para promover a melhor qualidade de vida dos animais em situação de abrigo – está avançando no Brasil nos últimos anos, com a criação de diversos materiais técnicos, cursos, consultorias e melhoras das estruturas físicas e manejos dos animais em situação de abrigo.

No Brasil, foi criada em 2022 a iniciativa Medicina de Abrigos Brasil – Infodados de Abrigos de Animais (https://mvabrigosbrasil.com.br/), com o objetivo de suprir a necessidade de promover a ciência da medicina de abrigos no país e obter dados representativos com base em estatísticas nacionais para o desenvolvimento de políticas públicas que reduzam o abandono de animais de estimação e promovam a sua adoção. No site da iniciativa, os abrigos brasileiros públicos, privados, mistos e os lares temporários e protetores independentes são mapeados quando cadastrados, e seus gestores podem, mensalmente, colocar seus dados da dinâmica populacional. No site há uma biblioteca com diversas obras de literatura técnica da área para a promoção da ciência da medicina de abrigos.

Um importante impacto da ciência da medicina de abrigos em nosso país foi o lançamento, em 2022, da primeira obra técnico-científica da área, o livro digital Medicina de abrigos: princípios e diretrizes. O intuito do ebook é a difusão do conhecimento técnico-científico em medicina de abrigos para a promoção do manejo e do bem-estar dos animais em situação de abrigo, o manejo populacional de cães e gatos, o ensino, a pesquisa e a extensão, e para auxiliar na atuação dos profissionais na área. O ebook foi promovido pelo Instituto de Medicina Veterinária do Coletivo, é dividido em 10 seções e conta com a contribuição de mais de 60 colaboradores, visando fornecer parâmetros e diretrizes de modo a padronizar e tornar corretos os mais diversos procedimentos e atividades rotineiras de abrigos de animais de acordo com a realidade brasileira a partir de uma sequência lógica, além de propiciar a disseminação e a circulação de informações e conhecimentos técnico-científicos acerca da medicina de abrigos no Brasil. O livro é composto por informações amplas, mas específicas e detalhadas, com fornecimento de materiais para aplicação das práticas, bem como para uma consulta rápida e precisa a artigos escritos por diversos profissionais e colaboradores experientes na área. Essa obra é de grande importância para que seja possível a transformação de condições adversas e de vulnerabilidade, favorecendo a promoção da saúde coletiva, o bem-estar animal e o desenvolvimento sustentável.

 

Cães em estado de magreza extrema em abrigo terceirizado de prefeitura do estado de Minas Gerais. Créditos: Gustavo Xaulim

 

Outra importante iniciativa foi a construção do projeto intitulado “A questão espacial dos abrigos públicos para animais em cidades brasileiras: análise e debate”. Esse projeto foi criado buscando ampliar o campo de debate acerca do espaço físico dos abrigos públicos de animais no Brasil; a atividade proposta é realizada pelo Grupo de Pesquisa em Ética e Direitos dos Animais do Núcleo de Estudos das Diversidades, Intolerâncias e Conflitos (Diversitas-FFLCH-USP). É realizado por meio de ciclos, anualmente, sendo que em cada ciclo são contempladas duas cidades brasileiras escolhidas a partir da inscrição de colaboradores e representantes. Cada ciclo proposto engloba encontros para a apresentação e o debate sobre o caso específico de um abrigo público de uma cidade elencada, com a realização de um colóquio final que se inicia com um pequeno resumo dos dois casos e dos debates traçados para as duas cidades, identificando seus pontos de convergência e possíveis encaminhamentos, seguido por uma ou mais palestras com convidados que estudam o tema.

Paulatinamente, a ciência da medicina de abrigos, integrada à medicina veterinária do coletivo, está sendo inserida nas grades curriculares das instituições de Ensino Superior no Brasil, incentivando a criação de rodas de discussões, grupos de estudos e projetos de extensão e pesquisas relacionadas ao tema. A Universidade Federal do Paraná (UFPR) trabalha com o tema desde 2018, em uma parceria com o Instituto PremieRpet®, que iniciou um projeto pioneiro com abrigos de cães e gatos para a melhora do nível de bem-estar dos animais mantidos nesses locais, o projeto Alimentando Sonhos. Foi publicado em português um dos principais guias internacionais da medicina de abrigos: Diretrizes sobre os padrões de cuidados em abrigos de animais, da Association of Shelter Veterinarians (Associação de Veterinários de Abrigos). Atualmente a UFPR desenvolve o Projeto de Medicina Veterinária de Abrigos, que estimula pós-graduandos de medicina veterinária do coletivo a atuar nos abrigos parceiros do projeto, com o objetivo de melhorar o nível de bem-estar dos animais, diminuir as suas taxas de mortalidade e morbidade e aumentar as taxas de adoção. A partir dessa parceria são produzidos materiais técnicos e lâminas em medicina de abrigos para disseminar as informações para os gestores e colaboradores que atuam em abrigos de animais.

Atualmente, o Departamento de Proteção, Defesa e Direitos Animais (DPDA), criado em 2023 e vinculado ao Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, está discutindo em reuniões técnicas com a presença de diversos setores relacionados à proteção e à defesa dos animais a construção do Programa Nacional de Manejo Populacional Ético de Cães e Gatos. Um dos possíveis e importantes produtos consiste na construção de um instrumento normativo com o fim de estabelecer as diretrizes para nortear o funcionamento de abrigos para cães e gatos em todo o território nacional, visando aprimorar sua atuação e garantir padrões mínimos de cuidado animal em todo o país. A adoção de diretrizes traz diversos benefícios:

• estabelece diretrizes específicas para nortear o funcionamento de abrigos públicos de animais, visando aprimorar sua atuação e garantir padrões mínimos de cuidado animal em todo o país;

• proporciona um quadro regulatório claro e abrangente, que facilita a aplicação de normas e regulamentos em nível local, estadual e federal;

• estabelece critérios para alojamento, alimentação, manejo sanitário, socialização, enriquecimento ambiental e adoção responsável, e ajuda a garantir que os animais recebam tratamento adequado, reduzindo riscos à saúde, estresse e sofrimento;

• promove a transparência e a prestação de contas;

• auxilia o médico-veterinário responsável técnico em suas atribuições e contribui para a profissionalização dos abrigos e a ciência da medicina de abrigos, promovendo a formação de equipes capacitadas e a adoção de boas práticas de governança e gestão; e, por fim,

• fortalece a imagem do país no que diz respeito à proteção e ao bem-estar animal.

Além da normativa, é importante continuar formando e treinando gestores, médicos-veterinários e colaboradores atuantes em abrigos de animais, por meio da educação em práticas específicas com protocolos e diretrizes que transformem de forma positiva a realidade atual. Os abrigos ainda têm grande dificuldade para garantir a saúde e o bem-estar dos animais no coletivo, além de educar toda a comunidade pela qual são responsáveis. As vastas aplicabilidades e a exigência de saberes específicos demonstram a necessidade do desenvolvimento de protocolos e de linhas orientadoras cujos objetivos finais se expressem na melhora do estado hígido e das condições higiênico-sanitárias dos animais abrigados, e no aumento do número de animais adotados. Um estudo realizado em 2022 com o objetivo de avaliar o perfil dos abrigos brasileiros em relação a suas políticas internas e externas demonstrou que 67,9% (239) dos 352 abrigos participantes eram de natureza particular e observou a falta de políticas públicas voltadas para a prevenção do abandono e do manejo populacional, além da falta de aplicabilidade de protocolos e manejos relacionados à medicina de abrigos 14. Outro estudo, também realizado em 2022, cujo objetivo foi avaliar as percepções de colaboradores atuantes em abrigos de animais sobre os manejos e protocolos em medicina de abrigos, retratou que 245, das 554 pessoas participantes das cinco regiões do Brasil, desconheciam que existe uma ciência relativa ao estudo dos animais em situação de abrigo 15.

Dessa forma, o oferecimento de cursos de formação nessa área dá subsídios a gestores, funcionários e profissionais atuantes para fornecer melhor qualidade de vida aos animais, compreender o papel do abrigo na sociedade e na saúde pública, saber aplicar os conhecimentos específicos e protocolos de abrigos e diminuir o número de abandonos e devoluções de animais às ruas, o que se reflete diretamente na resolução de problemas de saúde pública. Diante dessa problemática, o Instituto de Medicina Veterinária do Coletivo constantemente fornece cursos voltados à área, em especial o Curso de Capacitação de Medicina de Abrigos, que já está – atualmente – em sua quinta edição e já teve mais de mil participantes.

 

Medicina veterinária legal – medicina veterinária do coletivo e direito animal

Os avanços da medicina veterinária do coletivo foram acompanhados por avanços legislativos, especialmente em relação à tutela jurídica de cães e gatos, a ponto de hoje se apresentar uma disciplina jurídica própria para o tratamento dos animais como sujeitos de direitos – o direito animal 16.

O direito animal principia com a Constituição Federal de 1988, que positivou a regra da proibição da crueldade contra animais e o princípio da dignidade animal (Art. no. 225, § 1º, VII). Com base na Constituição, o Supremo Tribunal Federal proferiu vários precedentes históricos de proteção animal, como nos casos da farra do boi, das rinhas de galo, da vaquejada e da proibição do abate de animais resgatados em situação de maus-tratos.

Na legislação federal, destaca-se a Lei no. 9.605/1998 (Lei dos Crimes Ambientais), que tipificou crimes contra a fauna e, dentre eles, o crime de maus-tratos contra animais (Art. no. 32). Mais tarde, pela Lei no. 14.064/2020 (“Lei Sansão”), as penas para o crime de maus-tratos contra cães e gatos foram agravadas, permitindo uma repressão mais ampla da violência contra essas espécies animais.

 

Cão resgatado em rinha de Pitbulls em Minas Gerais. Créditos: Gustavo Xaulim

 

Também não podem ser esquecidas as Leis Federais no. 13.426/17, que proíbe o extermínio de cães e gatos como forma de controle populacional, e no. 14.228/21, que proíbe a eutanásia de cães e gatos por unidades de controle de zoonoses, canis públicos e estabelecimentos similares, exceto em casos de doenças graves ou enfermidades infectocontagiosas incuráveis que coloquem em risco a saúde humana e a de outros animais.

No âmbito da legislação estadual, merecem destaque as leis que passaram a reconhecer expressamente animais como sujeitos de direitos – Santa Catarina e Goiás (cães e gatos), Rio Grande do Sul (animais domésticos de estimação), Minas Gerais e Paraíba (todos os animais), sendo que este último estado foi o primeiro a estabelecer uma lista mínima de direitos para todos os animais 17.

Também muitos municípios hoje têm leis para estabelecer a proteção dos animais habitantes das cidades, especialmente cães e gatos, com normas diversificadas, incluindo fiscalização e atendimento a situações de maus-tratos e manejo populacional de caninos e felinos.

Desse arcabouço normativo aqui brevemente esboçado, pode-se dizer que, ao menos em relação a cães e gatos, há forte substrato jurídico para afirmar que se trata de animais com capacidade jurídica plena, ou seja, ainda que não possam ser considerados pessoas, são sujeitos de direito titulares do direito à vida e do direito à saúde (no que se inclui o direito ao tratamento médico-veterinário), o que torna o contínuo progresso da medicina veterinária do coletivo essencial para a implementação prática desses direitos fundamentais.

 

Referências 

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12-CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA VETERINÁRIA. Plano Nacional de Contingência de Desastres em Massa Envolvendo Animais. Dá suporte à conduta dos médicos-veterinários e zootecnistas que estão em campo resgatando animais vítimas de desastres, traz orientações para a atuação dos profissionais em cenários dessa natureza, com diretrizes de como conduzir o resgate, a assistência veterinária, a manutenção e a destinação de animais domésticos e silvestres. Brasília: CFMV, 2022. Disponível em: <https://www.cfmv.gov.br/plano-nacional-de-contingencia-de-desastres-em-massa-envolvendo-animal/comunicacao/publicacoes/2020/10/05/#28>. Acesso em 24 de agosto de 2023.

13-CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA VETERINÁRIA. Resolução CFMV n° 1511, de 28 de março de 2023. Institui diretrizes para a atuação de médicos-veterinários e zootecnistas em desastres em massa envolvendo animais domésticos e selvagens. Brasília: CFMV, 2023. Disponível em: <http://ts.cfmv.gov.br/manual/arquivos/resolucao/1511.pdf>. Acesso em 24 de agosto de 2023.

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